domingo, 20 de fevereiro de 2011

O Ébrio e a Graça


Proclamação do Evangelho segundo São Marmeladov, embriagado nas tabernas de Petesburgo

-Hoje, estive em casa de Sônia: fui lá pedir dinheiro para beber. Ah, ah, ah!
-E ela te deu? - perguntou um dos recém-chegados com um riso enorme na boca.
-Esta meia garrafa que vê foi paga com o dinheiro dela – replicou Marmeládov, dirigindo-se somente a Raskolnikov. - Ela me passou trinta copeques com suas próprias mãos, os últimos, tudo o que possuía, eu mesmo vi. Não me disse nada, limitando-se a olhar-me em silêncio... Um olhar que não era deste mundo, porém do céu, pois só lá em cima é que se pode sofrer assim pelos homens, chorar por eles, sem condená-los. Não, não me condenam, mas é pior quando não condenam. Trinta copeques, veja o senhor, entretanto precisava deles, não é? Que pensa disso, meu caro? Ela precisa manter-se decentemente agora. Essa decência custa dinheiro, uma decência especial, compreende? É preciso cremes, saias engomadas, sapatinhos mais elegantes, que protejam o pé quando se tem uma poça a saltar . Compreende, meu caro, compreende a importância dessa decência? Pois bem, e eu, seu próprio pai, eu lhe arranquei esses trinta copeques. Bebo, sim, já os bebi... Diga-me: quem, pois, terá pena dum homem como eu? Fale, senhor, agora tem pena de mim? Sim ou não? Diga! Ah, ah, ah, ah!
Quis encher o copo, mas a garrafa já estava vazia.
-Por que te lastimar? - bradou o dono da tasca, que apareceu novamente com dois homens.
Gargalhadas misturadas a impropérios estouravam no salão. Eram os ouvintes do funcionário que riam e zombavam. Os demais, que não o tinham ouvido, juntavam-se apenas para ver a sua cara.
-Lastimar-me? É por que me lastimarão eles – gritou de repente Marmeládov, levantando-se, agitando os braços, exaltado, como se não ouvisse senão estas palavras. - 'Porque me lastimar?', disseste. Sim, o caso não é para lastimar, é preciso crucificar-me, pregar-me numa cruz e não me lastimar. Crucifique-me, pois, juiz, faça-o e, crucificando-me, tenha dó do sacrificado. Então eu mesmo superarei o próprio suplício porque não é de alegria que tenho sede, mas de dor e de lágrimas. Acreditas, porventura, vendeiro, que tua meia garrafa me trouxe prazer? É a dor, a dor que procuro no fundo destes frascos, a dor e as lágrimas. Encontrei-as e sorvi-as. Porém não precisaremos apiedar-nos porque Aquele que teve piedade de todos os homens, Aquele que tudo compreendeu, o Único e nosso primeiro julgador, voltará no dia de Juízo e perguntará: “Onde está a virgem que se sacrificou por uma madrasta cruel e tísica, por crianças que não são suas irmãs? Onde está a filha que se apiedou de seu pai terrestre e não voltou a face, horrorizada, a esse bêbado crapuloso? Ele lhe dirá: “Vem. Já te perdoei uma vez... perdoei uma vez... E, agora que todos os teus pecados te sejam remidos, porque muito amaste...” E Ele perdoará a minha Sônia. Ele a perdoará, eu sei que a perdoará... Eu senti, há pouco, em meu coração, quando estive em sua casa. Todos serão julgados por Ele, os bons e os maus, os sábios e os humildes, e nós ouviremos seu verbo: “Aproximai”, dirá Ele, “aproximai também os bêbados, as criaturas fracas e modestas”. Avançaremos todos, sem temor, e pararemos diante d'Ele, que nos dirá: “Sois porcos, tendes a aparência do animal, trazeis a sua marca, mas vinde também”. Então, para Ele se voltarão os sensatos e os sábios e eles exclamarão: “Senhor, por que recebeis aqueles outros?”. E Ele lhes dirá: “Eu os recebo, ó sensatos, eu os recebo, ó sábios, porque nenhum deles se julgou digno dessa graça. E Ele nos estenderá seus braços divinos e nós nos precipitaremos para eles... E nos desfaremos em lágrimas. E compreenderemos tudo... Então, compreenderemos tudo... E todos compreenderão... Ekaterina Ivánovna também compreenderá... Senhor, que o Teu reino não tarde mais!
Dostoévski, em Crime e Castigo

Para começar

Hesitei por algum tempo sobre a possibilidade de dilatar minha personalidade na rede...

Mas eis-me aqui .. Me rendi à tentação ter algo a dizer!

Pois bem, assim começa o pensacional, lugar (existem lugares na Internet?) onde vou lançar alguns pensamentos, sensações, etc..., a fim de me livrar deles e poder manter a cabeça tranquila, coisa que não acontece se essas coisas de pensar e sentir, coisas pensacionais, não são postas para fora de algum jeito.

E esse jeito meio na moda foi o que encontrei...

Pensações minhas e de outros(devidamente referenciados) é o que se vai encontrar por aqui.

Que seja de algum proveito para alguém além de mim.

Cruzamos o Rubicão e alea iacta est (que coisa mais clichê!)

Simbora.